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Ciência Florestal, Vol. 21, No. 1, Jan-Mar, 2011, pp. 159-166 Branqueamento de polpa de eucalipto com sequências curtas Bleaching eucalypt pulps with short sequences Flaviana Reis Milagres1 Jorge Luiz Colodette2 Marcos Sousa Rabelo3 Danila Morais de Carvalho4 1. Engenheira Florestal, Mestre em Ciência Florestal, doutoranda em Ciência Florestal, Departamento de Engenharia Florestal, Universidade Federal de Viçosa, CEP 36570-000, Viçosa (MG). flavianamilagres@yahoo.com.br Recebido para publicação em 19/05/2009 e aceito em 1/07/2010. Code Number: cf11018 RESUMO A polpa kraft de Eucalyptus spp., em razão do elevado conteúdo de ácidos hexenurônicos, é relativamente fácil de ser branqueada Dessa forma, estudos têm sido feitos para diminuir o número de estágios de branqueamento na planta, minimizando assim importantes custos do processo. Este estudo teve como objetivo a avaliação de sequências curtas de branqueamento ECF (Elemental Chlorine Free) e TCF (Totally Chlorine Free): PMoDP (Peróxido de hidrogênio catalisado com molibdênio, seguido por estágios de dióxido de cloro e peróxido de hidrogênio), PMoD/P (Peróxido de hidrogênio catalisado com molibdênio, dióxido de cloro e peróxido de hidrogênio, sem lavagem entre os dois últimos estágios), PMoD(PO) (Peróxido de hidrogênio catalisado com molibdênio, dióxido de cloro e peróxido de hidrogênio pressurizado), D(EPO)DP (Dióxido de cloro, extração oxidativa com oxigênio e peróxido de hidrogênio, dióxido de cloro e peróxido de hidrogênio), PMoQ(PO) (Peróxido de hidrogênio catalisado com molibdênio, quelante e peróxido de hidrogênio pressurizado) e XPMoQ(PO) (Enzima, peróxido de hidrogênio catalisado com molibdênio, quelante e peróxido de hidrogênio pressurizado), com polpas kraft de Eucalyptus spp., buscando uma alvura de 90% ISO. Foram realizados estágios de branqueamento com tratamentos menos usuais tais como: peróxido ácido catalisado com molibdênio (PMo) e xilanase (X). Entre as sequências opcionais ECF, a sequência com dois estágios PMoD/P, mostrou um custo efetivo alto, no entando, sem afetar a qualidade da polpa em relação à sequência tradicional D(EPO)DP e obteve melhor qualidade do efluente também em relação à referência. Porém, a sequência de quatro estágios, XPMoQ(PO), alcançou a alvura desejada utilizando a tecnologia TCF. Essa sequência não teve um custo efetivo baixo, embora tenha produzido uma polpa de qualidade aceitável. Palavras chaves: Polpa ECF; polpa TCF; xilanase; peróxido catalisado. ABSTRACT Eucalyptus spp kraft pulp, due to its high content of hexenuronic acids, is quite easy to bleach. Therefore, investigations have been made attempting to decrease the number of stages in the bleaching process in order to minimize capital costs. This study focused on the evaluation of short ECF (Elemental Chlorine Free) and TCF (Totally Chlorine Free) sequences for bleaching oxygen delignified Eucalyptus spp. kraft pulp to 90% ISO brightness: PMoDP (Molybdenum catalyzed acid peroxide, chlorine dioxide and hydrogen peroxide), PMoD/P (Molybdenum catalyzed acid peroxide, chlorine dioxide and hydrogen peroxide, without washing) PMoD(PO) (Molybdenum catalyzed acid peroxide, chlorine dioxide and pressurized peroxide), D(EPO)DP (chlorine dioxide, extraction oxidative with oxygen and peroxide, chlorine dioxide and hydrogen peroxide), PMoQ(PO) (Molybdenum catalyzed acid peroxide, DTPA and pressurized peroxide), and XPMoQ(PO) (Enzyme, molybdenum catalyzed acid peroxide, DTPA and pressurized peroxide). Uncommon pulp treatments, such as molybdenum catalyzed acid peroxide (PMo) and xylanase (X) bleaching stages, were used. Among the ECF alternatives, the two-stage PMoD/P sequence proved highly cost-effective without affecting pulp quality in relation to the traditional D(EPO)DP sequence and produced better quality effluent in relation to the reference. However, a four stage sequence, XPMoQ(PO), was required to achieve full brightness using the TCF technology. This sequence was highly cost-effective although it only produced pulp of acceptable quality. Keywords: ECF pulp; TCF pulp; xylanase; acid-catalyzed peroxide bleaching. INTRODUÇÃO Atualmente, a instalação de uma planta moderna de branqueamento com cinco estágios (incluindo etapa de oxigênio), de grande porte (~3000 toneladas por dia), para polpa de Eucalyptus spp., requer investimentos da ordem de 40-50 milhões de dólares. Esse elevado investimento tem despertado grande interesse nos meios empresariais e científicos em busca de opções para simplificar o processo. Uma das opções para minimizar o investimento de capital é pela utilização de sequências curtas, com menor número de estágios de branqueamento, pois cada estágio instalado custa cerca de 10 milhões de dólares (MILANEZ et al. 2008). Sabe-se que grande parte dos reagentes químicos aplicados no branqueamento da polpa tem por objetivo principal remover o número kappa residual desta, que no caso do eucalipto é composto, basicamente, de lignina modificada e de ácidos hexenourônicos (CHAKAR et al., 2000; COSTA, 2001). Tem sido relatado em trabalhos na literatura (COSTA, 2001; LI e GELLERSTEDT, 1998) que o valor do número kappa medido na saída do digestor é representado por vários componentes da polpa potencialmente oxidáveis pelo KMnO4 e que depende da origem da polpa. A experiência prática industrial no Brasil monstra que o número kappa da polpa de eucalipto, que entra na operação de branqueamento, após cozimento e pré-deslignificação com oxigênio, varia na faixa de 9 a 11 (COSTA et al., 2000; VENTORIM et al., 2006). A minimização do kappa da celulose que entra no branqueamento e/ou aumento da branqueabilidade da polpa podem ser conseguidos pela redução do número kappa no digestor, ou pela redução do número kappa entre o digestor e o branqueamento. A redução do número kappa no digestor apresenta limitações, pois resulta em significativa perda de rendimento. A redução do número kappa entre o digestor e o branqueamento pode ser conseguida por várias técnicas, sendo uma boa opção o tratamento da polpa com enzimas xilanases (X), pois estas reduzem a necessidade de reagentes químicos contendo cloro (SACON, 1993). Outra opção seria o uso do peróxido ácido catalisado por molibdênio (PMo). Hämäläinen et al. (2003) e Rabelo (2006), mostraram que o estágio PMo pode economizar até 15 kg/t de ClO2, expresso como cloro ativo. Portanto, este estudo teve por objetivo reduzir o número kappa, entre digestor e branqueamento, pelo uso dos estágios PMo e X, seguido de branqueamento, com sequências curtas. MATERIAIS E MÉTODOS Foram realizados branqueamentos laboratoriais com polpas de Eucalyptus spp., provenientes da indústria kraft e pré-deslignificadas com oxigênio (Tabela 1). Foram avaliadas três sequências ECF: PMoDP, PMoD/P e PMoD(PO). No primeiro caso (sequência PMoDP), a polpa pré-deslignificada com oxigênio, foi tratada com peróxido de hidrogênio ácido catalisado com molibdênio na torre de alta consistência de polpa pré-branqueada a qual, é encontrada em todas as indústrias e não é considerada um estágio de branqueamento. Após, a polpa seguiu para o estágio com dióxido de cloro e finalmente para o estágio com peróxido de hidrogênio atmosférico, com lavagem entre eles. No segundo caso (sequência PMoD/P), o mesmo procedimento foi realizado, porém, foi omitida lavagem entre os estágios com dióxido de cloro e peróxido de hidrogênio. No terceiro caso (sequência PMoD(PO)), após o estágio com peróxido de hidrogênio ácido catalisado com molibdênio, foi realizado um estágio com dióxido de cloro, sendo que foi aplicada uma carga fixa de 10,0 kg ClO2/ta.s. (dióxido de cloro por tonelada absolutamente seca) de polpa, e posteriormente um estágio com peróxido pressurizado, havendo lavagem entre os estágios. Foram avaliadas duas sequências TCF: XPMoQ(PO) e PMoQ(PO). No tratamento XPMoQ(PO), a polpa pré-deslignificada com oxigênio, posteriormente, foi tratada com a enzima xilanase (X), em seguida passou pelo estágio com peróxido de hidrogênio ácido catalisado com molibdênio (PMo), seguindo a sequência com o quelante DTPA (Q), e finalmente tratamento com peróxido de hidrogênio pressurizado(PO). A sequência PMoQ(PO) foi realizada similarmente a anterior, exceto, sem o estágio X. Após cada estágio de branqueamento foram avaliados os seguintes parâmetros: número kappa (exceto no estágio D), viscosidade, ácidos hexenourônicos, alvura e reversão de alvura, que foram medidos conforme procedimentos descritos na Tabela 2. Todas as análises foram efetuadas em duplicata. Condições do branqueamento e etapas de otimizações As condições gerais utilizadas em cada estágio de branqueamento, das sequências estudas, estão apresentadas na Tabela 3. Cada estágio de branqueamento foi realizado em duplicata. RESULTADOS E DISCUSSÃO Branqueamento ECF referência: sequência D(EPO)DP A sequência D(EPO)DP é uma das mais utilizadas para o branqueamento de polpa de eucalipto na atualidade, por isso foi admitida aqui como sequência referência (LOREIRO et al. 2009; ROBLES et al. 2006; SUESS et al. 2001). Os resultados obtidos com esta sequência são apresentados na Figura 1. Para esta sequência de branqueamento, tida como referência, o teto de alvura desejado de 90% ISO foi alcançado utilizando uma carga de 2 kg de H2O2/tas no P final, e consumo de 41 kg/tas de cloro ativo total, com todas as outras condições constantes. Robles et al. (2006) desejando atingir um teto de alvura de 92% ISO, utilizaram esta mesma sequência, porém com temperaturas mais elevadas no D inicial (90 ºC), sendo necessária uma carga de 3 kg de H2O2/tas no P final, e consumo de 46,64 kg/tas de cloro ativo total. Branqueamento ECF e TCF com sequências curtas Dentre as sequências ECF: PMoD/P, PMoDP e PMoD(PO), e TCF: XPMoQ(PO) e PMoQ(PO), avaliadas, as únicas que resultaram em polpa branqueada de alvura 90% ISO, foram as sequências PMoD/P, PMoDP e XPMoQ(PO). As Figura 2, Figura 3 e Figura 4 mostram os resultados alcançados com essas três sequências, respectivamente. A sequência PMoD/P (Figura 2) atingiu a alvura de 89,9% ISO com dosagens de 20 kg/tas de ClO2 no estágio D e 15 kg/tas de H2O2 no estágio P. Por outro lado, a sequência PMoDP (Figura 3) alcançou alvura de 90,3% ISO com estas mesmas dosagens, indicando não haver necessidade de lavar a polpa entre os estágios D e P. Por outro lado, a sequência TCF XPMoQ(PO) demandou 10 kg/t de H2O2 no estágio PMo e 50 kg/t de H2O2 no estágio (PO) para alcançar alvura de 90,4% ISO (Figura 4). Não foi possível alcançar a alvura de 90% ISO com a sequência PMoQ(PO), como destacado na Figura 5, onde não foi utilizada a enzima xilanase. Todas as sequências opcionais, ECF ou TCF, produziram polpas branqueadas de viscosidade inferiores à da sequência referência que foi de 22,1 cP, sendo mais baixa a viscosidade da polpa TCF XPMoQ(PO) com 10,0 cP, que utilizou carga muito elevada (50 kg/tas) de peróxido de hidrogênio no estágio (PO). As maiores perdas de viscosidade ocorreram nos estágios Do (primeiro estágio com dióxido de cloro) e (EPO) da sequência referência e P/(PO) das sequências opcionais. Como podemos observar nas Figura 2 e Figura 3, as sequências ECF opcionais produziram polpas branqueada contendo menores teores de HexA´s que a sequência referência, fato explicado pela presença de estágios PMo e D na sequência. O estágio PMo vem demonstrando ser bastante efetivo para degradar os HexA´s em outros trabalhos citados na literatura (HÄMÄLÄINEN et al. 2003; Rabelo, 2006). No caso da sequência TCF XPMoQ(PO) (Figura 4), observou-se o maior residual de HexA´s (17,2 mmol/kg) na polpa branqueada, embora com o estágio PMo. Esse resultado pode ser explicado pela ausência do estágio D. Note que os estágios X e (PO) não são efetivos para remover os HexA´s. A maior queda no teor de HexA´s durante o branqueamento TCF com a sequência XPMoQ(PO) ocorreu no estágio PMo. Pequena remoção de HexA´s foi também observado no estágio X, o que pode ser explicado pela extração de xilanas nessa etapa, segundo Roncero et al. (2005), durante a produção de polpas kraft parte das cadeias de xilanas precipitam na superfície das fibras. A enzima xilanase tem como função a hidrólise dessas xilanas, e a eliminação, consequentemente, da barreira física da superfície das fibras antes criada por tais hemiceluloses, melhorando assim a penetração dos reagentes químicos nos estágios posteriores de branqueamento. Os valores finais de número kappa das polpas branqueadas PMoD/P, XPMoDP, PMoQ(PO) e PMoQ(PO) foram, respectivamente, 0,8, 1,0, 1,9 e 1,8 sendo os valores mais altos para as polpas TCF. Com base no número kappa, não houve boa correlação entre os teores de HexA´s e de lignina residuais, indicando diferenças entre as sequências no que tange à remoção de lignina. O estágio PMo foi efetivo para a remoção de número kappa, demonstrando o caráter eletrofílico desse estágio. Reversão de alvura das polpas branqueadas Em geral, a reversão de alvura das polpas branqueadas pelas sequências opcionais foram superiores à da sequência referência D(EPO)DP2, porém os valores obtidos foram aceitáveis, da ordem de 1,8-2,0% ISO de perda, de acordo com o método Tappi UM200 (Tabela 2). De acordo com Buchert et al. (1997), a reversão de alvura é proporcional ao conteúdo de ácidos hexenurônicos na polpa e de acordo com Forsskåhl et al. (2000), a indução ao amarelecimento da polpa está fundamentada em reações com a lignina residual e com os carboidratos, porém a reversão neste estudo (Tabela 4), não se correlacionou bem com os valores de kappa e HexA´s encontrados na polpa branqueada. Recentemente, Gellerstedt et al. (2003) citam que nem os ácidos hexenurônicos presentes nas xilanas, nem as estruturas oxidadas tipo não-ligninas (carboxilas e carbonilas na celulose) contribuem, na sua origem, para a cor da polpa. Mas, significativa mudança pode ser observada no conteúdo desses componentes durante o branqueamento, sendo essas mudanças talvez responsáveis pela reversão de alvura e ainda citam que é no estágio de deslignificação com oxigênio que ocorre o aumento de estruturas oxidadas tipo não-ligninas, porém o conteúdo de HexA´s permanece inalterado. Custos dos reagentes de branqueamento De acordo com a Tabela 4, as sequências opcionais mostraram-se mais caras que a sequência referência D(EPO)DP2, porém, a sequência PMoD/P resultou em um aumento de custo da ordem de 35% a mais que a referência, mas vantajosamente, possui apenas dois estágios completos de branqueamento, ou seja o estágio PMo e o estágio D/P, lembrando que esses dois últimos estágios são considerados como um único estágio, além disso necessitou menor quantidade de cloro ativo total (20 kg/tas), assim como a sequência PMoDP. A sequência referência com quatro estágios necessitou um total de cloro ativo de 41 kg/tas. Além disso, o estágio PMo pode ser efetuado na torre de estocagem da indústria, o que, consequentemente, reduz tal sequência para apenas um estágio. Caracterização dos efluentes A Tabela 5 apresenta a caracterização dos efluentes gerados pelas sequências de branqueamento e também a caracterização da sequência referência D(EPO)DP2, pré-estabelecida anteriormente. Comparativamente, à sequência referência, as sequências opcionaiss produziram efluentes com menores teores de AOX, porém as cargas orgânicas medidas pelos valores de DQO e o TOC foram maiores para essas sequências, exceto no caso da sequência PMoD/P, e no valor do TOC da sequência PMoDP. De fato a sequência PMoD/P destacou-se por produzir o efluente de mais baixa cor, DQO, TOC e AOX que a referência. CONCLUSÕES Concluiu-se que a sequência de branqueamento PMoD/P produz polpa branqueada de qualidade similar a da sequência D(EPO)DP, com as vantagens de gerar efluente de menor carga orgânica, AOX e cor, e de ser uma sequência de apenas dois estágios, sendo um destes incompleto, já que o estágio PMo pode ser efetuado na torre de estocagem. Como desvantagem, a sequência PMoD/P, apresenta custo de reagentes químicos cerca de 35% mais elevado que a referência, sendo esse custo, provavelmente contrabalanceado pelos menores custos de vapor, energia elétrica e manutenção. Apesar da sequência TCF, XPMoQ(PO), não ter sido vantajosa em relação as demais sequências, ficou comprovado que a enzima utilizada aumentou a alvura e a qualidade da polpa, diminuindo a carga de peróxido de hidrogênio que seria utilizada para alcançar a alvura de 90% ISO, além de diminuir a degradação da polpa, com o aumento da viscosidade. AGRADECIMENTO Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), pelo financiamento do projeto. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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