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Ciência Florestal
Centro de Pesquisas Florestais - CEPEF, Departamento de Ciências Florestais - DCFL, Programa de Pós Graduação em Engenharia Florestal - PPGEF
ISSN: 0103-9954 EISSN: 1980-5098
Vol. 21, Num. 1, 2011, pp. 167-174

Ciência Florestal, Vol. 21, No. 1, Jan-Mar, 2011, pp. 167-174

Caracterização tecnológica da madeira de Eucalyptus benthamii para produção de celulose kraft

Technological characterization of Eucalyptus benthamii wood for kraft pulp production

Isabel Cristina Nogueira Alves1 José Lívio Gomide2 Jorge Luiz Colodette3 Helton Damin da Silva4

1. Engenheira Florestal, Mestre em Ciências Florestais, Universidade Federal de Viçosa, Departamento de Engenharia Florestal, CEP 36570-000, Viçosa (MG). isabel.alves@ufv.br
2. Engenheiro Florestal, PhD., Professor Titular do Departamento de Engenharia Florestal, Universidade Federal de Viçosa, Departamento de Engenharia Florestal, CEP 36570, Viçosa (MG). jlgomide@ufv.br
3. Engenheiro Florestal, PhD., Professor Titular do Departamento de Engenharia Florestal, Universidade Federal de Viçosa, Departamento de Engenharia Florestal, CEP 36570, Viçosa (MG). colodett@ufv.br
4. Engenheiro Florestal, Dr., Pesquisador da Embrapa Florestas, Caixa-Postal 319, CEP 83411-000, Colombo (PR). helton@cnpf.embrapa.br

Recebido para publicação em 24/07/2009 e aceito em 9/06/2010.

Code Number: cf11019

RESUMO

O objetivo deste trabalho foi avaliar a qualidade tecnológica da madeira de Eucalyptus benthamii para produção de celulose kraft. Suas características foram comparadas com as de um híbrido de Eucalyptus grandis x Eucalyptus urophylla que é, provavelmente, o clone mais plantado no Brasil e, portanto, de grande importância no setor nacional de celulose e papel. Determinaram-se a densidade básica, composição química e características dimensionais das fibras das duas espécies. A madeira do Eucalyptus benthamii apresentou estrutura anatômica bastante semelhante às outras espécies do gênero e, ainda, densidade básica e dimensões das fibras dentro dos parâmetros dos clones de Eucalyptus utilizados atualmente pela indústria nacional de celulose e papel. Do ponto de vista de constituição química, o Eucalyptus benthamii demonstrou possuir qualidade tecnológica inferior à do híbrido urograndis, pois apresentou maiores teores de extrativos e de lignina, menor teor de glucanas, maior teor de galactanas e menor relação S/G (Siringila/Guaiacila), características que contribuem para um menor rendimento em polpa. Estudos deverão ser realizados para avaliar o desempenho da espécie na polpação kraft, no branqueamento e as propriedades de resistências da polpa celulósica.

Palavras-chave: densidade básica; constituição química; características anatômicas; dimensões de fibras.

ABSTRACT

The purpose of this study was to evaluate the quality of Eucalyptus benthamii wood for kraft pulp production. A hybrid of Eucalyptus urophylla x Eucalyptus grandis, probably the most planted Eucalyptus clone in Brazil, was also analyzed for comparison purposes. Basic density, chemical composition and fiber dimensions were determined for the two species. The Eucalyptus benthamii wood presented an anatomical structure, basic density and fiber dimensions quite similar to those of other species planted by the Brazilian pulp industry. However, it presented poorer wood quality characteristics when compared to the hybrid urograndis species, with higher amounts of extractives and lignin, lower amount of glucans, more galactans and lower S/G ratio, characteristics leading to lower pulping yield. Additional studies should be carried out to establish its pulping, bleaching and paper strength properties.

Keywords: wood specific gravity; chemical composition; anatomical characteristics; fiber dimensions.

INTRODUÇÃO

Ao encerrar 2008, com uma produção superior a 12,8 milhões de toneladas (FALEIROS, 2009), o Brasil alcançou a posição de quarto maior produtor mundial de celulose, ultrapassando a Suécia e a Finlândia. Ainda, segundo a mesma autora, em 2008 o setor nacional de celulose e papel exportou quase 6 bilhões de dólares, crescendo 30,6% nas exportações de celulose e 14,6% nas exportações de papel.

A produção nacional de celulose é predominantemente de Eucalyptus que representa mais de 85% do total. A posição de destaque no mercado mundial foi alcançada graças à elevada produtividade das florestas nacionais de Eucalyptus e a alta qualidade dessa madeira, conforme demonstrado por Gomide (2005). O grande crescimento previsto para a produção nacional de celulose de Eucalyptus, com novas e grandes fábricas nos estados do Maranhão, Piauí, Bahia, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul e Rio Grande do Sul, deverá proporcionar aumento de produção superior a 13 milhões de toneladas anuais até o ano de 2015. Para que o Brasil possa concretizar esse tremendo aumento de produção de celulose será indispensável a contínua melhoria de produtividade das florestas clonais de Eucalyptus e da qualidade dessa madeira, além do estabelecimento de florestas com novas espécies não convencionais no Brasil.

O grande crescimento previsto da indústria nacional de celulose irá demandar plantio de extensas áreas de florestas de Eucalyptus e, certamente, estudos de espécies resistentes ao frio, para plantio nos estados da Região Sul do Brasil, serão de grande importância para o setor. Os estados dessa região apresentam condições climáticas bastante peculiares, com invernos bem rigorosos sendo comum a ocorrência de geadas em algumas áreas. Dessa forma, a escolha de espécies do gênero Eucalyptus aptas ao cultivo nesses locais fica limitada a apenas algumas poucas espécies, dentre elas o Eucalyptus viminalis e o Eucalyptus dunnii, mas novos estudos têm demonstrado a potencialidade para plantio de Eucalyptus benthamii.

Segundo levantamentos recentes, a área de ocorrência natural do Eucalyptus benthamii na Austrália limita-se a pequenas populações ao oeste da cidade de Sydney, em planícies ao longo do rio Nepean e seus afluentes (HIGA e PEREIRA, 2003). Esse fato é consequência do desmatamento da população original visando à formação de pastagens e da inundação de algumas áreas para construção da represa de Warragamba. Aliado a esses fatores, a preferência por solos férteis tornou a espécie vulnerável, chegando a ser considerada extinta.

Em 1988, a EMBRAPA (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) importou sementes de Eucalyptus benthamii da Austrália, estabeleceu uma área de produção de sementes e realizou o plantio da espécie em regiões de ocorrência de geadas severas nos três estados do sul. Os resultados iniciais mostraram que a espécie é bastante tolerante a geadas, suportando temperaturas negativas na fase inicial de desenvolvimento, sem efeitos negativos às plantas e, além disso, a espécie apresentou também um bom crescimento, atingindo incremento médio anual de 45 m3.

Higa e Carvalho (1990) observaram, na região de Dois Vizinhos, no estado do Paraná, altura média de 16 m e DAP médio de 15 cm aos 45 meses de idade e concluíram que a espécie merece atenção especial dos melhoristas florestais. A espécie é também apontada como promissora em áreas montanhosas do estado de Minas Gerais.

São poucas as áreas de plantio ao redor do mundo com Eucalyptus benthamii e, consequentemente, há carência de informações mais detalhadas sobre a espécie. Na área de papel e celulose, por exemplo, não há muitos trabalhos publicados utilizando essa espécie. Little e Gardner (2003) analisaram o crescimento, em locais de elevadas altitudes, de 20 espécies de Eucalyptus destinadas à produção de madeira para celulose e observaram bom potencial do Eucalyptus benthamii, mas se deve considerar que os autores se basearam somente no seu incremento médio anual. Clark e Hicks (2003), estudando o potencial de 13 espécies menos conhecidas de Eucalyptus, plantadas em diferentes regiões da Austrália, concluíram que o Eucalyptus benthamii não apresentava um bom desempenho, resultando em baixos rendimentos em polpa.

Este estudo teve como objetivo avaliar a qualidade tecnológica da madeira de Eucalyptus benthamii, plantada no Brasil, por meio de análises físicas, químicas e anatômicas, visando obter maiores informações sobre a qualidade da sua madeira para produção de celulose. Suas características foram comparadas às de um clone híbrido de Eucalyptus grandis x Eucalyptus urophylla, provavelmente o mais plantado no Brasil e que, portanto, apresenta grande importância no setor nacional de celulose e papel. Esse híbrido foi selecionado propositalmente para estudos comparativos por apresentar madeira de alta qualidade para produção de celulose.

MATERIAL E MÉTODOS

Para realização deste estudo, foram utilizadas cinco árvores de Eucalyptus benthamii, aos 6 anos de idade, procedentes de povoamento experimental da Embrapa Florestas, localizado em Guarapuava, PR, e três árvores de híbridos de Eucalyptus urophylla x Eucalyptus grandis, aos 7 anos de idade, provenientes do sul da Bahia.

Em cada árvore, foram retirados toretes na base e nas alturas de 25, 50, 75 e 100% da altura comercial (até diâmetro mínimo de 7 cm). Os toretes foram transformados em cavacos num picador laboratorial de discos, dotado de três facas e de duas peneiras classificadoras vibratórias, com aberturas de malhas de 40 x 40 cm e 5 x 5 cm. Foi realizada uma classificação manual, para eliminação de pedaços de cascas, de nós e de cavacos com defeitos de corte. Os cavacos, classificados e homogeneizados, foram secados ao ar para uniformização da umidade e para conservação contra eventual desenvolvimento de micro-organismos e, posteriormente, armazenados em sacos de polietileno. Para obtenção das amostras utilizadas nas determinações de densidade básica, análises químicas e análises de fibras, foi utilizada a técnica de quarteamento.

Determinação da densidade básica

Para determinação da densidade básica, utilizaram-se cavacos do conjunto de árvores por espécie, por meio da relação entre o peso absolutamente seco e o volume saturado dos cavacos, conforme o método da balança hidrostática estabelecido na norma NBR 11941 da Associação Brasileira de Normas Técnicas – ABNT.

Análises anatômicas e morfológicas

Realizou-se a descrição anatômica somente da madeira de Eucalytpus benthamii, por se tratar de uma espécie ainda pouco estudada.

Para descrição anatômica do Eucalytpus benthamii foram utilizadas amostras da região do cerne, do cerne periférico e do alburno de cada árvore, provenientes da parte superior do torete retirado na base da árvore. Esse procedimento seguiu a norma COPANT (1974). Os cortes anatômicos foram feitos com espessura média de 16 μm, utilizando um micrótomo de deslize horizontal. De cada amostra foram realizados cortes nos planos transversal, longitudinal tangencial e longitudinal radial. Os cortes anatômicos foram desidratados em série alcoólica, corados com solução de safranina, e as lâminas foram fixadas com Entelan. Cada lâmina permanente constou de três cortes corados. Após a secagem da lâmina, por um período médio de 24 horas, foi utilizado microscópio ótico para análises das diferentes células lenhosas e suas organizações e realizadas medições de frequência e de áreas dos vasos.

As análises das fibras foram realizadas no macerado preparado partindo da madeira. Depois de desagregadas e lavadas, as amostras foram coradas com azul de Astra e em seguida retirou-se uma pequena quantidade da suspensão para o preparo das lâminas provisórias.

Com auxílio de um vídeo microscópio computadorizado (analisador de imagens) foram mensuradas cem fibras para cada amostra. Na mensuração das fibras, determinaram-se comprimento, largura e diâmetro do lume das fibras. A espessura da parede celular da fibra foi determinada matematicamente pela metade da diferença entre a largura da fibra e o diâmetro do lume.

Análises químicas

Para a caracterização química da madeira, foi utilizada uma amostra de cavacos, do conjunto de árvores por espécie, conforme os seguintes procedimentos ou normas: amostragem e preparação da madeira para análises, conforme a norma TAPPI T 257 cm-85 (TAPPI, 1996); preparação da madeira para a análise química, conforme a norma TAPPI T 264 om-88 (TAPPI, 1996); determinação do teor de extrativos, conforme a norma TAPPI T 204 om-88 (TAPPI, 1996); determinação do teor de lignina insolúvel em ácido, conforme Gomide (1986); lignina Klason solúvel em ácido, conforme Goldschmid (1971); análise de carboidratos (açúcares), conforme Wallis et al. (1996), modificada; teor de ácidos urônicos, segundo Englyst e Cummings (1984); análise de grupos siringila e guaiacila, conforme Lin e Dence (1992), por cromatografia líquida após oxidação com nitrobenzeno; e análise de grupos acetilas, conforme Solar et al. (1987), modificada.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Descrição anatômica e dimensões das fibras

Análises dos cortes anatômicos demonstraram que a estrutura anatômica do Eucalyptus benthamii é bastante semelhante às de outras espécies do gênero. Nas três regiões analisadas (alburno, cerne periférico, cerne), os anéis de crescimento apresentaram-se indistintos. Observou-se a presença de três tipos de parênquima axial: paratraqueal vasicêntrico, paratraqueal confluente e, em menor quantidade, paratraqueal lateral. O parênquima radial é caracterizado pela presença de raios unisseriados e bisseriados. Os raios são homogêneos e formados somente por células procumbentes. O Eucalyptus benthamii apresentou teor de células de parênquimas similar ao das espécies de eucaliptos normalmente utilizadas no Brasil para produção de celulose.

Os vasos apresentaram formato circular, predominantemente solitários, com porosidade difusa e arranjo tendendo a diagonal; as placas de perfuração são simples, característica comum do gênero, com ocorrência de tiloses. Na Tabela 1, pode ser observado que a região do cerne apresentou maior frequência de vasos mas os vasos com maiores diâmetros estavam localizados na região do alburno. Silva et al. (2007) encontraram comportamento semelhante estudando a influência da posição radial nas dimensões dos vasos da madeira de Eucalyptus grandis Hill ex. Maiden. Os valores de diâmetro médio dos vasos do Eucalyptus benthamii foram um pouco menores que os encontrados por esses autores, o que pode ser explicado pela diferença entre espécies e idades.

Os vasos são muito importantes tanto para a fisiologia e crescimento das árvores, como para os processos de conversão da madeira em celulose. Sua presença nas madeiras de folhosas favorece a penetração e impregnação dos cavacos de folhosas pelo licor de cozimento kraft. Entretanto, não é desejável que a madeira utilizada para produção de celulose apresente alto teor dessas células, pois alto teor de vasos implica em madeira de menor densidade proporcionando menor produtividade na fábrica e maior consumo específico de madeira.

Os resultados apresentados na Tabela 2 mostram que houve diferença significativa para todas as dimensões das fibras, sendo que a madeira do Eucalyptus benthamii apresentou fibras mais curtas (0,96 mm) e mais estreitas (17,9 µm) que o híbrido urograndis (1,07 mm e 20,1 µm respectivamente). Nisgoski et al. (1998) encontraram comprimento médio das fibras menores numa amostra de Eucalyptus benthamii proveniente de Colombo, Paraná (0,818 mm). O comprimento médio encontrado para o híbrido urograndis está em conformidade ao relatado por Carvalho e Nahuz (2001).

Alguns autores relatam que o comprimento e a espessura da parede celular das fibras são os parâmetros anatômicos mais intensamente estudados (FLORSHEIM, 1992; URBINATI, 1998), pois as variações nas dimensões das fibras podem ter influência na qualidade da madeira e na produção de papel. Fibras de maiores comprimentos favorecem a resistência ao rasgo, já as de menores comprimentos propiciam melhor formação da folha de papel. Gomide et al. (2005) relatam que fibras com parede celular mais espessa conferem maior opacidade e melhor maciez aos papéis para impressão e escrita e papéis “tissue”, respectivamente.

Densidade básica e composição química

Como pode ser observado na Tabela 3, a madeira do Eucalyptus benthamii apresentou densidade básica pouco inferior (472 kg.m-3) a do híbrido urograndis (499 kg.m-3), mas dentro da faixa das obtidas em estudo realizado por Trugilho et al. (2004). Esses autores, estudando madeiras de 15 clones de Eucalyptus para produção de celulose, encontraram valores médios de densidade básica de 477 kg.m-3, sendo o valor máximo 571 kg.m-3 e o mínimo 405 kg.m-3.

A densidade básica da madeira é a quantificação direta do material lenhoso por unidade de volume, estando relacionada com as propriedades e características tecnológicas para a produção e utilização de produtos florestais. Para produção de papel e celulose é desejável que a madeira possua densidade uniforme, pois a velocidade de impregnação e de deslignificação dos cavacos é influenciada pela massa específica.

Existem divergências quanto aos valores mais adequados de densidade básica para o processo de polpação. Densidades mais elevadas podem proporcionar maior produtividade em razão da maior carga por um determinado volume do digestor. Entretanto, é necessário uma maior carga de álcali na polpação e, além disso, Ferreira et al. (2006b) comentam que madeiras mais densas podem causar perdas de características desejáveis para produção de papel para imprimir e escrever.

Segundo Gomide et al. (2005), as madeiras com densidades básicas mais baixas apresentam algumas vantagens como a necessidade de utilização de menor carga alcalina, com reflexos favoráveis no rendimento e viscosidade da polpa celulósica e também carga mais baixa de sólidos para o setor de recuperação. Entretanto, densidades mais baixas resultam em consumo específico de madeira mais elevado, o que constitui significativa desvantagem.

O teor de extrativos solúveis em acetona do Eucalyptus benthamii foi aproximadamente 160% superior ao do urograndis, porém o teor de extrativos hidrofóbicos solúveis em diclorometano, responsáveis pela formação de “pitch”, grande fonte de problemas na indústria de papel e celulose, foi 65% inferior. Gomide et al. (2005) comentam que madeiras com altos teores de extrativos tendem a apresentar menor rendimento em polpa.

As duas madeiras analisadas apresentaram teores de lignina típicos das madeiras de Eucalyptus plantadas no Brasil. O híbrido urograndis apresentou teor de lignina total ligeiramente inferior (29,6%) ao do Eucalyptus benthamii (30,3%) e uma maior relação siringila/guaiacila (2,9 e 2,4, respectivamente). Barbosa et al. (2008) relataram que a velocidade de deslignificação da madeira é influenciada pala estrutura da lignina, sendo diretamente proporcional à relação S/G, uma vez que a estrutura siringila da lignina é mais reativa e, portanto, mais fácil de ser removida durante o processo de polpação kraft.

Gomes et al. (2008), estudando clones comerciais de Eucalyptus, encontraram boas correlações entre a relação S/G e o rendimento depurado e ressaltam que a madeira desejável para produção de celulose kraft deve apresentar baixo teor de lignina associado a uma alta relação S/G.

A constituição da fração de carboidratos das madeiras estudadas está apresentada na Tabela 4. As glicanas foram responsáveis por pouco menos de 50% da constituição química das madeiras, seguidas das xilanas com 11,2% e 10,8% para o Eucalyptus benthamii e o híbrido urograndis respectivamente. Os teores das outras hemiceluloses foram todos inferiores a 1% nas duas madeiras, valores típicos para madeiras de eucalipto no Brasil. As principais diferenças, em termos de carboidratos, entre as madeiras de Eucalyptus benthamii e o híbrido urograndis foram o teor significativamente superior de glucanas (celulose) do urograndis (48,5 e 46,6%), o teor de xilanas ligeiramente superior do Eucalyptus benthamii (11,2 e 10,8%) e o teor de galactanas duas vezes maior do Eucalyptus benthamii (1,8 e 0,90%). O teor de celulose está diretamente associado ao rendimento de polpação, constituindo, portanto, numa desvantagem do Eucalyptus benthamii. O teor mais elevado de galactana nessa espécie também constitui uma característica desvantajosa, uma vez que as galactanas são facilmente degradadas na polpação, prejudicando o rendimento do processo.

Os teores de ácidos urônicos e de grupos acetilas nas duas madeiras foram muito semelhantes e, portanto, seus efeitos na qualidade da madeira para polpação kraft deverão ser similares. Os ácidos urônicos, geradores de ácidos hexenurônicos durante a polpação kraft, que afetam negativamente o branqueamento (Costa et al., 2001), não deverão apresentar efeito diferenciado no processamento das duas madeiras.

Os teores de grupos acetilas determinados foram relativamente baixos, quando comparados aos teores encontrados em alguns clones de eucalipto plantados no Brasil (Gomide et al., 2005; Ferreira et al. 2006a), constituindo uma vantagem de qualidade para ambas as madeiras. Os grupos acetila são desvantajosos na produção de celulose por serem facilmente removidos durante o cozimento, causando perda de rendimento e consumindo álcali. Em estudos realizados por Gomide e Fantuzzi Neto (2000) e por Pimenta (2006), com madeiras de híbrido urograndis, foi demonstrado que os grupos acetilas já haviam sido completamente removidos quando a temperatura máxima de cozimento era alcançada.

CONCLUSÕES

A madeira do Eucalyptus benthamii apresentou estrutura anatômica bastante semelhante às de outras espécies do gênero e densidade básica e dimensões das fibras dentro dos parâmetros dos clones utilizados atualmente pela indústria nacional de celulose e papel.

Do ponto de vista de constituição química, o Eucalyptus benthamii apresentou qualidade inferior à do híbrido, uma vez que apresentou maior teor de extrativos e de lignina, menor teor de glucanas, maior teor de galactanas e menor relação S/G (siringila/guaiacila), fatores que contribuem para um menor rendimento em polpa.

É importante ressaltar que o Eucalyptus benthamii foi comparado com um clone de alta qualidade e de grande importância no cenário nacional que já foi submetido a vários programas de seleção e de melhoramento genético, práticas usuais nas empresas nacionais do setor florestal. Além disso, novos estudos mais detalhados deverão ser realizados para avaliar o desempenho dessa espécie no processo de polpação kraft e branqueamento da polpa celulósica.

AGRADECIMENTOS

À Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG) pela concessão da bolsa de estudos, à Cooperativa Agrária Agroindustrial e à Golden Tree Reflorestadora pelo fornecimento das amostras de Eucalyptus benthamii.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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